Considerações de uma Roteirista em Los Angeles após o Oscar 2025
Demorei 2 dias para absorver o Oscar 2025.
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Imagem Divulgação |
Vamos primeiro para a opinião superficial:
O Brasil ganhou seu primeiro Oscar, um momento histórico, e eu me joguei no chão chorando de emoção.
Fernanda Torres merecia mais do que a Mikey.
O Brutalista e Conclave pareciam escolhas óbvias.
Robô Selvagem capturou meu coração de um jeito que não consegui evitar ficar triste por não ter ganhado.
Estou muito feliz de ver Kieran Culkin ganhando o prêmio, acho ele incrível.
Timothée Chalamet estava melhor em Duna.
Estou radiante que A Substância não ganhou quase nada.
Adrien Brody era óbvio demais, mas sim, ele estava ótimo.
Anora é um filme incrível em termos de roteiro e conceito.
Ainda Estou Aqui definitivamente deveria ter sido indicado para Melhor Roteiro Adaptado, e Walter deveria ter sido indicado para Melhor Diretor.
Dito isso, vamos nos aprofundar:
O Oscar, sendo um dos prêmios mais prestigiados do mundo, carrega um peso simbólico e histórico muito forte. No entanto, é inegável que, apesar de seu alcance global, ele continua sendo um prêmio americano feito por americanos e para americanos. Não tem como fugir dessa realidade. A indústria cinematográfica de Hollywood, que é o coração do evento, gira essencialmente em torno das dinâmicas de poder, gosto e preferências dos Estados Unidos. E, embora isso seja um fato óbvio, muitas vezes se torna invisível quando comemoramos as vitórias da estatueta dourada.Eu cheguei agora na indústria do cinema, mas já o suficiente para entender a complexidade do que significa fazer um filme do início ao fim. O processo de produção envolve muito mais do que se imagina. Logística, orçamento, relações interpessoais e, claro, o trabalho criativo são desafios diários. E é nesse contexto que percebo a verdadeira grandiosidade dos filmes de baixo orçamento conseguirem se destacar em uma premiação como o Oscar. Filmes como Anora e O Brutalista são exemplos claros de como o cinema precisa e deve ser mais do que apenas o glamour de Hollywood. Essas produções representam resistência e uma afirmação do poder da arte cinematográfica, independentemente das condições financeiras. Elas chegam tão longe e se fazem ouvir não porque o sistema as favoreceu, mas porque a arte e a determinação de seus criadores conseguiram romper barreiras de mercado e ganhar visibilidade. Não me entenda mal, eles tinham grandes nomes ao lado deles – não é como se ninguém soubesse quem era Sean Baker –, mas o fato de até mesmo ele ter chegado tão longe já é uma vitória por si só.
O que realmente importa nesses casos não é apenas o prêmio, mas o processo. O que essas produções representam e o que aqueles envolvidos conquistaram até chegarem à linha de chegada. O Oscar, em sua essência, muitas vezes reflete a indústria do entretenimento que privilegia, em muitos momentos, a grandiosidade e o financiamento. Mas, mesmo com orçamentos reduzidos, é possível criar obras significativas e impactantes. O valor do processo está na jornada e no impacto que esses filmes têm ao quebrar as expectativas do mercado, ao mesmo tempo em que revelam a beleza de um cinema mais íntimo e comprometido com a história que deseja contar.
Sean Baker, um nome que se tornou sinônimo de inovação e resistência dentro do cinema independente, representa muito do que deveria ser valorizado no Oscar: a busca por autenticidade e representatividade. Seu trabalho desafiou convenções e criou espaço para histórias que antes eram negligenciadas. A importância de cineastas como Baker é inegável, pois ele conseguiu transcender os limites do sistema dos estúdios e criar um cinema mais acessível e plural. Brady Corbet também segue essa linha de cinema, dedicando-se a contar histórias autênticas, muitas vezes vindas das periferias ou de um cinema que se afasta dos grandes orçamentos e efeitos especiais. Eles, como tantos outros, representam uma nova onda que deveria ser mais considerada em um evento como o Oscar.
Mikey Madison está absolutamente impecável no papel. Sua atuação é um exemplo de como a naturalidade e a sinceridade podem se traduzir em performances poderosas. Sua atuação é uma lição de como a simplicidade pode ser mais impressionante do que qualquer grandiosidade. Em um espectro mais cínico, Kieran Culkin, por outro lado, pode ter apenas interpretado a si mesmo no papel. E isso não é uma crítica negativa; pelo contrário, é uma forma de dizer que sua performance trouxe uma camada de autenticidade, um toque pessoal que torna a história ainda mais crível.
O que o Oscar muitas vezes esquece de valorizar – e nós também – é a verdadeira importância do processo. O que Ainda Estou Aqui e seus criadores, incluindo a campanha de Fernanda Torres, conquistaram ao longo do caminho até a premiação é mais significativo do que o prêmio em si. Não se trata de um simples reconhecimento, mas de um reflexo da dedicação e do compromisso de todos os envolvidos. A verdadeira vitória está nas lições aprendidas, nas barreiras superadas e no impacto duradouro que essas produções têm no futuro do cinema.
Por fim, é importante perceber que, como Conclave nos mostrou, quando colocamos uma câmera dentro da Academia, o que vemos são pessoas com suas próprias agendas, experiências e vieses. Esses membros, embora experientes e com grande conhecimento da indústria, não são seres mágicos ou infalíveis. São apenas seres humanos, cujas decisões são influenciadas por suas próprias realidades, muitas vezes contaminadas por preconceitos ou preferências pessoais. Isso faz parte do processo e é absolutamente normal. Não devemos idealizar a Academia como uma entidade superior que decide o que é "melhor" de forma absoluta. Eles estão lá, como todos nós, refletindo a indústria cinematográfica como ela é, com suas falhas, limitações e também suas conquistas.
Conclusão
Então é isso: cheguei agora, ainda estou aprendendo, mas já consegui mudar muito da minha perspectiva sobre as coisas. Sou uma pessoa mais velha entrando numa indústria que pode parecer mágica e glamourosa. Mas tenho discernimento para entender quando usar essa magia e quando terei que lidar com o Mágico de Oz. Também sou um ser humano, e um brasileiro – CLARO que acho que a Fernanda deveria ter ganhado, CLARO que estou super feliz que o Brasil teve o reconhecimento que merecia, CLARO que quero mais para o meu país e comemorei e torci como se fosse Copa do Mundo. Mas tirando a amarelinha por um segundo, o que fizemos, o que vimos nessa premiação, não só para o Brasil, mas para os cineastas independentes, foi muito f***.PS: A única coisa que ainda (estou aqui) tentando entender são as 13 indicações de Emilia Pérez. Acho que tem algo a ver com dinheiro e marketing, sabe? Mas não tenho certeza.

Roteirista e diretora brasileira baseada em Los Angeles. Fundadora da CURADORIA Story Lab, desenvolve projetos autorais e colaborações, além de fomentar a comunidade de escritores. Além do cinema, compartilha conteúdos nas redes sociais sobre filmes, escrita e lifestyle em LA. |
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